23.6.08

Azedo

Sexta fui atacado de novo em São Paulo. Não, não é a primeira vez nesta cidade e muito menos nessa vida que me agridem por tão pouco. Por miséria.

Estava subindo a Consolação quando fui abordado por um cara, da minha idade, pedindo dinheiro para comer. Estava frio, mas eu não tinha para ajudá-lo. Quando tenho, ajudo, por que não? Não me faz falta na maioria das vezes, mas dessa vez faria... fez.

Disse-lhe que não podia ajudar e continuei andando, mas o moço insistiu. Continuou caminhando ao meu lado e insistindo. Quando notei, já estava sendo agredido por outro cara que eu nem havia notado que estava ali. Colocando a mão no meu bolso e gritando para eu me apressar. Mantive a calma e continuei firme. "Não tenho hoje, já disse!".

- Então passa o celular pra gente levar pra nossos bróder na cadeia!

Puta merda... já tinham levado meu celular há uns 2 meses atrás. Perdi vários números importantes e fotos que me alegravam.

- Não, meu celular não. Tó. Leva essa grana.

O mais agressivo dos dois enfiou a mão na minha carteira e pegou a grana como se já fosse dele. Quis enfiar a mão na cara dele. Me controlei. O outro tentava acalmar o companheiro, mas ele se irritou, jogou o dinheiro no amigo e foi embora. Devia estar "cherado" ou algo do tipo.

O primeiro pegou minha mão e pediu perdão umas 5 vezes. Disse que vivia na rua e que não queria me atrapalhar daquela forma. Só conhecia aquele jeito de viver. Eu o olhei nos olhos e perdoei-o. Ele se foi com os 20 Reais.

20 Reais, muito pouco para me aborrecer. Não foi a falta da grana que me deixou azedo até hoje, foi a situação. Sabe, aquilo é real. Acontece todo dia. Aonde a gente vive? No inferno da miséria? Pegue hoje por que amanhã já acabou. Culpa de quem? Solução de onde? Maldito competivismo!

Faço meu protesto contra o já-tão-comum-que-nem-abala. Pois minha alma é caipira.

Lamento Sertanejo
Composição: Dominguinhos / Gilberto Gil

Por ser de lá
Do sertão, lá do cerrado
Lá do interior do mato
Da caatinga do roçado.

Eu quase não saio
Eu quase não tenho amigos
Eu quase que não consigo
Ficar na cidade sem viver contrariado.

Por ser de lá
Na certa por isso mesmo
Não gosto de cama mole
Não sei comer sem torresmo.

Eu quase não falo
Eu quase não sei de nada
Sou como rês desgarrada
Nessa multidão boiada caminhando a esmo.

À meu pai, que come quieto.